Em mais de 2 décadas ela evoluiu muito, inclusive no que se refere a segurança
Imagine a cena: dezenas de pessoas em uma sala abrindo caixas e mais caixas e contando milhares de papeis. Junte a esse cenário membros dos diferentes partidos fiscalizando (e pressionando) mais o cansaço de horas a fio de trabalho. Agora me diga… isso tinha como dar certo? Pois, saiba que até 1996, quando a primeira urna eletrônica foi desenvolvida, era assim a contagem de votos no Brasil.
Existe uma geração inteira que não viu essa cena e não imagina como era passível de fraudes. Além disso, era extremamente lento. Por exemplo, em 1994, levou cerca de 14 dias para ser oficializada a vitória do candidato Fernando Henrique Cardoso. Hoje, leva-se pouco mais de 12 horas e, isso, por causa dos diferentes fusos horários do país. Como a urna eletrônica é um projeto totalmente desenvolvido em solo nacional, temos a tendência de achar que ela não funciona. No entanto, vamos te mostrar que isso é bem diferente da realidade.
Apesar do que muitos propagam, não é apenas o Brasil que utiliza um equipamento eletrônico para votação. Segundo informações do Instituto Internacional para a Democracia e Assistência Social (IDEA Internacional) 23 países usam esse método em eleições gerais e 18 em pleitos regionais. Por exemplo, Suíça, Austrália e Japão são alguns que se beneficiam da tecnologia. Enquanto Reino Unido e França estudam a sua implementação.
Para começar é bom ressaltar que a ideia de ter um dispositivo para votação não é novo. No primeiro Código Eleitoral, datado em 1932, no artigo 57, era previsto “uso das máquinas de votar, regulado oportunamente pelo Tribunal Superior [Eleitoral]” e assegurado o direito ao sigilo do voto. No entanto, a tecnologia da época não permitia a sua criação. Somente na década de 90 foi possível desenvolver o primeiro protótipo. Nas eleições de 96, eleitores de 57 cidades votaram pela primeira vez dessa forma. Na época o aparelho era bem simples, ainda usava disquete e teclado do eleitor de membrana. O processador era um 386SX de 40Mhz, com apenas 2MB de memória RAM e a impressora era matricial.
Mesmo mais simplório, as primeiras já contavam com dispositivos de segurança, como o Boletim de Urna que era criptografado. Em outras palavras, isso significava que os resultados eram gravados e não podiam ser modificados. Estes eram levados aos equipamentos responsáveis para totalização dos votos. Em mais de 25 anos de história, ela evoluiu junto com a tecnologia e, hoje, existem diferentes camadas de segurança.
A primeira eleição totalmente informatizada ocorreu no ano 2000. Aqui, a urna eletrônica já usava mídia do tipo CompactFlash, chamado pela Justiça Eleitoral de Flash Card. Eles tinham 15MB e cada aparelho possuía 2, assim gravando em ambos para ter um backup. A impressora passou a ser térmica e o processador era um Cyrix Geode de 100Mhz, com 8MB de RAM.
Provavelmente você nem reparou que ela já mudou tanto. Na verdade, a cada dois anos uma nova geração do dispositivo é desenvolvida. Assim, as antigas são descartadas ecologicamente e enviadas a reciclarem. Segundo o TSE “isso garante que os equipamentos utilizados pelos eleitores sejam sempre atualizados com o que há de mais moderno em tecnologia e segurança”.
Para as eleições de 2022, ela contará com a certificação ICP-Brasil (Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira) do hardware de segurança – também chamado de perímetro criptográfico – feita por um laboratório credenciado pelo Inmetro. Além disso, passará a ser colorida.
A urna eletrônica brasileira é testada incansavelmente. Desde 2015 esses testes passaram a fazer parte do calendário eleitoral e qualquer brasileiro, maior de 18 anos, pode participar. Bem como, há chamamentos públicos para isso. Intitulado de Teste Público de Segurança (TPS), eles acontecem em anos ímpares (quando não há eleição) e são divulgados no site da justiça eleitoral – https://www.justicaeleitoral.jus.br/tps/.
Vale ressaltar que, até o momento, nenhum participante do TPS conseguiu efetivamente violar a segurança do equipamento ou mesmo o sigilo do voto. Além disso, segundo o órgão “cada investigador que nos aponta defeitos, colabora para melhorar a eficiência do processo”.
Muito se fala sobre prováveis invasões ao sistema da urna, mas isso é praticamente impossível de acontecer. Primeiramente, ela não possui nenhum mecanismo que permita ligação com a internet. Não possui hardware (o que já torna impraticável a conexão), além disso, não tem fio que permita se conectar, Bluetooth ou Wi-fi. O sistema operacional é preparado para não incluir nenhum mecanismo que permita a conexão.
Elas também funcionam com software totalmente desenvolvido pelo TSE. Nesse sentido, para as eleições de 2002, passaram a funcionar com programas desenvolvidos pelo órgão e lacrados pelas autoridades eleitorais. Para isso, foi introduzida uma assinatura digital do software e dos dados, incluindo os resultados que ela produz. Já em 2008 todas passaram a usar o sistema operacional Linux.
Os TPS contribuem muito para a segurança cada vez maior da urna eletrônica. Segundo o TSE, a cada rodada de testes são criadas “mais barreiras, como o fortalecimento do RDV, a inserção de novas assinaturas digitais em várias camadas do sistema e uma maior diversidade no conjunto de chaves digitais”.
Já na sua fabricação a segurança é ponto importante. Elas saem sem operação e só podem funcionar após alguns procedimentos como a verificação da certificação digital. Além disso, o sistema de segurança funciona em camadas, criando barreiras de proteção em diferentes níveis. Ou seja, se sofrer um ataque desencadeia uma reação que vai resultar no travamento do equipamento. Isso impossibilita a geração de um voto válido.
Como a urna não tem conexão com a internet, muitos se perguntam como os votos são contabilizados. Primeiramente, não é possível identificar qual voto e de qual pessoa. Isso porque eles são computados de maneira embaralhada e criptografada. Essa informação fica armazenada no aparelho até o final da votação. Nesse momento, o sistema interno calcula e produz um arquivo chamado Registro Digital de Voto. Este é gravado na Memória de Resultado, uma espécie de pen drive de uso exclusivo da Justiça Eleitoral.
Esta Memória de Resultado é levada, em envelope lacrado, até um fiscal em um ponto físico com acesso ao sistema da Justiça. Com uma assinatura digital, esses dados são autenticados e transmitidos para o Tribunal Regional Eleitoral do estado, por uma rede de comunicação exclusiva da Receita Federal. Ainda nos TREs, as informações passam por uma série de certificações de segurança até serem totalizados. Dessa forma, é conferida a assinatura digital, para ter certeza que aqueles dados foram gerados pela urna eletrônica que estava na seção eleitoral.
Lembrando que, assim que termina a eleição, o equipamento imprimi um Boletim de Urna. Nele tem o registro detalhado de todos os votos digitados naquele aparelho. Este passo pode ser acompanhado pelos fiscais dos partidos. Nesse sentido, ainda permite, quando divulgado o resultado, conferir os dados de cada seção eleitoral.
Desde a primeira houve uma preocupação com a acessibilidade. Em 1996 os teclados já continham inscrições em braile. Nos anos seguintes, interpretes de Libras passaram a auxiliar pessoas surdas. A nova versão (chamada de UE2020) contará com a sintetização de voz aprimorada para facilitar a compreensão de pessoas com deficiência visual e a inclusão de interpretes de Libras em vídeo.
– UE96: era uma urna bem simples, apenas com dois disquetes, e com o teclado do eleitor de membrana (mas que já continha Braille). O processador era um 386SX de 40Mhz, com apenas 2MB de memória RAM. A impressora era matricial (de agulhas).
– UE98: um tipo intermediário, que iniciou o padrão que ficou até 2004. Esse modelo foi o primeiro a ter a mídia do tipo CompactFlash, chamado na Justiça Eleitoral de Flash Card. Em 1998, o uso de memórias de estado sólido do tipo flash (hoje usadas nos SSDs) era inovador. As mídias tinham 15MB e cada urna possuía duas, para que os votos fossem gravados em ambas, a fim de evitar perdas. A impressora passou a ser térmica e, o processador, um Cyrix Geode de 100Mhz, com 8MB de RAM.
– UE 2000: a urna ficou bem semelhante à anterior, com algumas evoluções de memória e processador e uma impressora com maior resolução. Bem como, o teclado foi melhorado, tendo sido implementado um mecanismo mecânico, de contato metálico resistivo, utilizado até hoje.
– UE2006: a Justiça Eleitoral acrescentou o leitor biométrico no terminal do mesário. Nas Eleições de 2008, foram testadas as primeiras urnas eletrônicas com leitores biométricos nos municípios de São João Batista (SC), Fátima do Sul (MS) e Colorado do Oeste (RO). Dessa forma, depois do sucesso da revisão biométrica nas três cidades, a Justiça Eleitoral decidiu dar continuidade ao projeto de identificação biométrica que se usa até hoje.
– UE2009: a arquitetura de segurança do hardware teve forte inovação: foi criado o hardware de segurança, um outro processador, do tipo ARM, que verifica se os primeiros códigos ainda em hardware são autênticos. Esse mecanismo somente permite que softwares oficiais assinados digitalmente pelo TSE sejam executados na urna. Além disso, com ele, o software da urna apenas pode ser executado em um oficial. A medida fez com que a urna fosse chamada de T-DRE (Trusted Direct Recording Electronic), o que a diferencia de qualquer outra no mundo.
– UE2010, UE2011, UE2013 e UE2015: com relação ao modelo de 2009, o de 2010 teve evoluções no hardware de segurança e, a partir de então, esses equipamentos não passaram por mudanças relevantes.
Fonte: TSE